terça-feira, 21 de julho de 2009

Desenvolvimento da capacidade de resiliência: uma alternativa frente aos desafios da contemporaneidade?


“A resiliência costuma ser definida como uma característica comum entre as pessoas que costumam responder satisfatória e saudavelmente aos processos de mudança e de incerteza ao longo da vida.


Ao tomarmos por referência as características do mundo contemporâneo, verifica-se o quanto o desenvolvimento da resiliência é imprescindível. Contudo, já os antigos gregos, por acreditarem ser muito perigoso supor que planos sempre se materializam de acordo com o esperado, referiam-se, de alguma forma, à necessidade de adquirir resiliência, quando mencionavam a 'inteligência prática', que vem da valorização da adaptabilidade e da crença que a preparação e a escolha permitem ao sujeito influenciar seu futuro, como uma característica que faria as pessoas se prepararem melhor para enfrentar mudanças (Flach, 1991; Conner, 1995).


Pessoas resilientes sentem os mesmos medos e apreensões que todo mundo quando se envolvem em uma mudança. Porém, elas geralmente são capazes de manter sua produtividade, qualidade e competência, assim como o equilíbrio de sua saúde emocional, física e social, ao mesmo tempo que vencem desafios e alcançam a maioria dos objetivos, sejam eles pessoais ou coletivos. A resiliência, portanto, está associada à capacidade de aprender continuamente consigo mesmo, com os outros, com o contexto.


O desenvolvimento da resiliência permite às pessoas ampliar sua capacidade de recuperação ao serem expostas aos estresses da mudança, bem como a capacidade de enfrentar a ambiguidade, ansiedade e perda de controle que acompanham qualquer processo de mudança, fortificando-se com as experiências, em vez de se sentirem esgotadas.


Para Conner (1995), algumas pessoas tendem a ver, sobretudo, as implicações perigosas das mudanças, enquanto outras tendem a se concentrar nas promessas de novas oportunidades que podem ser encontradas nas mudanças. Esse autor identifica o primeiro grupo como o de 'pessoas orientadas pelo perigo', porque essas pessoas vêem a crise da mudança como algo ameaçador e podem se sentir vitimadas por ela. Costumam interpretar a vida em termos binário e sequencial, esperando que as mudanças progridam lógica e ordenadamente e, portanto, têm dificuldades em lidar com a ambivalência que envolve as situações de mudança. Quando confrontadas com a mudança, geralmente são reativas, e não produtivas.
Já o segundo grupo, o das 'pessoas orientadas pela oportunidade', apesar de reconhecerem os perigos, colocam a mudança como uma vantagem em potencial a ser explorada, em vez de um problema a ser evitado, isto é, possuem uma visão otimista da vida, que lhes permite lidar com a confusão e as adversidades da mudança, sendo capazes de se reorientarem, revendo seus propósitos sem abandoná-los. Esses propósitos podem ser expressos por crenças religiosas, convicções políticas, filosóficas ou por um projeto de vida. Para essas pessoas, a vida é vista como um conjunto de variáveis interativas, constantemente em modificação, e supõem que o futuro trará um novo conjunto de oportunidades e escolhas que levarão a desafios mais complexos. Acreditam que as frustrações e desconfortos fazem parte do processo de adaptação que a mudança exige. As pessoas orientadas pela oportunidade geralmente são independentes e auto-suficientes, mas reconhecem suas limitações e sabem pedir ajuda, pois confiam nos relacionamentos pessoais. Elas aceitam a mudança como parte natural da vida e sabem equilibrar suas expectativas, tendo como parâmetro as possibilidades da realidade.


É importante salientar que um comportamento orientado para o perigo não é necessariamente ruim, pois não há nada de errado em resistir à mudança, pelo contrário: a resistência é uma resposta saudável e natural a expectativas quebradas. Em determinadas situações, esse tipo de resposta é tão legítima e apropriada quanto a orientada pela oportunidade, mas quando essas reações (orientadas pelo perigo) se tornam predeterminadas, instintivas e habituais, geram problemas. Além disso, todos nós temos as duas tendências, diferenciando-nos, contudo, pela intensidade e pelas circunstâncias em que essas tendências são manifestadas.


Nesse sentido, é pertinente salientar que, embora possamos falar em características das pessoas resilientes, isso não significa que tais pessoas não possam apresentar um baixo grau de resiliência diante de determinadas dimensões ou situações de vida e em diferentes momentos da vida. Isto ocorre, fundamentalmente, pela dinamicidade que compõe o funcionamento da personalidade de cada sujeito (Castilhos, 2002).


Conner (1995) aponta elementos que identificam o comportamento das pessoas orientadas pela oportunidade e refletem as cinco características básicas da resiliência: positividade, vêem a vida como desafiadora, mas cheia de oportunidades; foco, têm uma visão clara do que querem alcançar e realizar; flexibilidade, são maleáveis ao responder à incerteza; organização, desenvolvem abordagens estruturadas para gerenciar a ambiguidade; proação, induzem mudanças em vez de se defenderem delas.


Por sua vez, Flach (1991) aponta as seguintes características de pessoas resilientes:
capacidade de aprendizagem;
tolerância à frustração e ao sofrimento;
criatividade na solução de problemas;
habilidade de resgate da autoestima quando em situações em que ela está abalada; sentimento de auto-respeito;
autonomia, liberdade e interdependência;
habilidade de fazer e manter amigos (vínculos afetivos);
disposição para sonhar;
apurado senso de humor;
interesses diversificados;
capacidade de determinar os limites de profundidade de uma relação de dependência;
percepção de si e do que está a sua volta;
contextualização interna e externa;
perspectiva de vida sustentada em uma filosofia vital e processual, que permite interpretar as experiências da vida como um todo, extraindo um significado pessoal.


Flach (1991) refere-se, contudo, ao importante papel que um ambiente de apoio exerce na sustentação da resiliência. Segundo esse autor, é possível identificar vários elementos que podem facilitar a resiliência – e não é nenhuma surpresa que esses elementos se ajustem perfeitamente às características básicas da personalidade resiliente. Isso inclui:


estruturas coerentes, mas flexíveis;
um grupo de pessoas que possibilitem o contato humano acolhedor;
sentido de comunidade;
comunicação aberta e receptividade a novas ideias;
respeito, reconhecimento, aceitação;
limites de comportamento definidos e realistas;
garantia de privacidade;
tolerância às mudanças e aos conflitos;
busca de reconciliação;
valores humanos construtivos; esperança e empatia.


Pensando em ambientes resilientes, cabe refletir sobre o quanto as organizações estão conseguindo fazer a gestão de tais atributos em seu clima organizacional, por exemplo. Na mesma linha, Fernandes (1996) afirma que é preciso atentar para uma gama de fatores que, quando presentes em uma situação de trabalho, refletem-se na satisfação e participação do trabalhador, mobilizando suas energias e atualizando seu potencial.


À medida que as organizações adquirem vida através das pessoas que as compõem, observa-se que aumentar o grau de resiliência de uma organização só é possível quando há avaliação, canalização e desenvolvimento de potenciais, num movimento de aprendizagem contínua e interdependente, capaz de transformar competência individuais em coletivas. E competência coletiva está essencialmente vinculada a um estado de consciência coletiva que se traduz e se consolida na capacidade das pessoas de refletir e agir interdependentemente. Em última análise, isso remete à construção de um ambiente de trabalho mais propício à realização humana, e, portanto, com mais qualidade de vida.” (sic)


{Patrícia Martins Fagundes}
Fonte: Gestão contemporânea de pessoas: novas práticas, conceitos tradicionais. / organização por Claudia Bitencourt. Porto Alegre: Bookman, 2004.

Um comentário:

  1. Texto profundo e um tanto complexo do ponto de vista evolutivo pois aborda a resiliência e a capacidade das pessoas de se adaptarem a novas siutações, novos desafios. Como cada ser humano é único - e aí entra o caráter evolutivo de cada indivíduo - podemos rascunhar a conclusão de que a capacidade de resiliência é diretamente proporcional à evolução, crescimento e amadurecimento de cada um.

    Eu disse "rascunhar" justamente porque não é uma conclusão definitiva. Basta ver crianças que apresentam essa capacidade de adaptação logo cedo, o que nos leva a pensar em algum fator genético também.

    De qualquer forma, vale a reflexão sobre o tema e sua usabilidade em nosso dia-a-dia, conosco mesmos ou com aqueles com quem convivemos. A própria interpretação do texto, somada à sua aplicação - e consequente mudança - já mostra o quanto somos capazes de nos adaptarmos à novas ideias e situações.

    Beijoe!!!!

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